sábado, 19 de novembro de 2011

Flor

Ela floria aqui, ali e acolá. Tinha cores e texturas e cheiros lindos. Ela era do tipo que cheira bonito e fala bonito e sente bonito.
Despistadamente e sutilmente e levemente deixava vez ou outra cair algumas sementes nos terrenos áridos por onde passava. Porque ela também era do tipo que plantava.
Ela vivia no tempo dela.
A modernidade e suas imperfeições sociais lhe tornavam uma pessoa um tanto quanto desambientada em certos momentos, mas ela se sobrepunha a isso sem fazer muito esforço. Possuía um sorriso sincero e sempre livre a quem se aproximasse, o que conquistava de pronto os mais abertos.
Ela era gênero.
As várias espécies tinham cada uma suas próprias características, mas quaisquer que fossem, estavam presas no gênero, que absoluto, continha todas elas. Texturas das mais aveludadas às mais ásperas podiam conviver ali dentro, podia sem contradição possuir cada característica, por mais antônima que fosse, e isso não lhe pareceria estranho ou incomum, porque ela era gênero.
De mais a mais, de tempos em tempos, gostava que observassem a sua expressão da beleza, e por puro exibicionismo, vestia-se de pétalas, escolhidas a dedo, e pontilhadas de brilhantes. Lembrava-me do orvalho que encontrávamos pela manhã naquela planta de folhas grandes, naqueles tempos em que chovia colorido. Ela, nestes momentos, era a mais pura expressão da lembrança. Aquela que é doce e leve, mas que chega longe e dá uma saudadezinha.
Ela era firme.
Sua postura não denunciava, mas ela era firme. Sua rigidez em certos momentos vinha como que para torturar os mais flexíveis. Sua delicadeza podia inexplicavelmente sumir sem deixar rastros nos momentos de fúria. Parecia frágil, mas possuía uma força incomum. Física, inclusive.
Não esperava que esperassem de sua parte demonstrações explosivas de carinho, ou exposições de peque. Este era o lado que ela preferia esconder, principalmente de si mesma. E que jamais admitia. Porque ela tinha uma característica absolutamente pessoal: Só falava a verdade. Ainda que fosse uma verdade controlada, calculadamente pensada para que não se adentrasse a zona de perigo onde ficar exposto seria inevitável.
Ela possuía um dom. O de insistir até que o mais resistente desistisse.
Este era um dom difícil de se ver assim, aplicado no limite. Não porque fosse incomum, mas porque ao chegar na metade das possíveis demonstrações qualquer expectador já se perceberia exausto.  Ela era incansável.
Uns diriam que esta característica chamava-se persistência, outros mera teimosia, eu, em alguns momentos, poderia afirmar que era chatice pura, só pra testar os meus limites, porque de teimosia em teimosia eu e ela poderíamos travar a mais longa batalha do universo.
Mas, no fundo, eu achava bonito, porque isso a tornava tão admirável aos meus olhos... No fundo -que ela não saiba-, mas eu sabia que ela era uma das únicas que me venceria caso travássemos o duelo da resistência, embora - afastando minha tão característica modéstia- não sem nenhum arranhão...
Ela era de libra, mas não acreditava nestas coisas. Ainda assim, os astros provavelmente explicariam sua indecisão constante quando a decisão a tomar envolvia a demonstração de seus sentimentos. Ela vivia na busca interna  e constante de se revelar sem se expor.
Ela era grande.
Mas sua altura era nada perto da sua grandeza de caráter. E de sua grandeza de esperança. E do tamanho dos seus sonhos.
Ela era sonhadora. E não precisava ter os pés no chão. Não podia mesmo ter os pés no chão. Esta limitação seria penosa demais para quem sabia o quão longe poderia ir.
Ela era infinita para quem se deixasse sentir. E isso fazia toda a diferença na vida de quem a guardava no coração.